O conflito secular entre Crato e Juazeiro do Norte sempre teve uma figura central: Padre Cícero. Contudo, aos poucos, as romarias que antes eram predominantes no município juazeirense fundado pelo sacerdote começam a ultrapassar os limites geográficos. Agora, uma evidência que reforça o local exato onde nasceu o “padrinho” pode impulsionar as visitas ao território cratense.
As dúvidas que pairam sobre a vida do Pe. Cícero começam desde o seu nascimento, que pode ter acontecido em 23 ou 24 de março de 1844, isso porque no seu registro de batismo coloca-se a primeira data, enquanto o sacerdote sempre festejou seu aniversário no segundo dia. Isso não é diferente do local exato de onde Joaquina Ferreira Gastão, a dona Quinô, sua mãe, teve o parto do bebê que seria aclamado pelos romeiros.
O notável historiador padre Antônio Gomes de Araújo, falecido em 1989, que batiza o Departamento Histórico Diocesano de Crato, levantou, através de pesquisa oral, duas hipóteses. A primeira, contada por uma antiga escrava da família do sacerdote, conhecida como “Teresa do Padre”, indica que o fundador de Juazeiro nasceu na antiga “Rua Grande”, atual Rua Dr. Miguel Limaverde, nas proximidades da Praça Siqueira Campos. Já a segunda, que teria sido contada pela mulher que foi “co-parteira” do nascimento do sacerdote, Missias Correia de Macêdo, aponta para um imóvel na antiga Rua do Pisa – atual Rua Dom Quintino, onde está o Palácio Episcopal.
Ambas nunca saíram do campo da especulação até que, na semana passada, a inauguração de uma cafeteria, vizinha ao Palácio Episcopal, em Crato, trouxe à tona o que pode ser uma evidência do local onde o religioso foi concebido. Durante a reforma do estabelecimento, descobriu-se a estrutura de uma parede antiga, ainda de pé, reforçando o que seria a casa de Antônio Ferreira Gastão, tio de Padre Cícero. “É uma parede muito grossa, que destoa do restante do prédio e faz divisa entre o café e o palácio”, conta o advogado e pesquisador Heitor Feitosa.
Comprovação
O padre Francisco Roserlândio de Souza, coordenador do Departamento Histórico Diocesano de Crato, pondera que a tradição oral fala que o terreno onde hoje está o Palácio é o mesmo onde esteve erguida uma casa que pertenceu ao major João Bispo Sobreira, que teria sido tio do sacerdote, “mas não há, documentalmente falando, nenhuma prova de que aquele ‘pedaço’ da parede seja da casa”, diz.
O pesquisador Heitor Feitosa crê na veracidade do nascimento do Padre Cícero na então Rua Grande. Mas ele reconhece que é preciso buscar comprovação documental. “Ir atrás das escrituras públicas do Palácio ou da casa vizinha, olhar a cadeia de domínio e encontrar os donos anteriores. Se tiver Antônio Ferreira Gastão, é um elemento palpável para se comprovar”, acredita Heitor.
Agora, estudiosos vão iniciar um trabalho minucioso para comprovar essa tese já sugerida há quatro décadas, pelo já falecido historiador padre Antônio Gomes. A investigação começará nos cartórios da época. Com a comprovação, a expectativa é que o lugar entre para o roteiro turístico religioso da região que, atualmente, atrai mais de 2,5 milhões de católicos.
Roteiro turístico expandido
O Crato preserva outros importantes locais ligados ao “Padrinho” que estão, aos poucos, despertando a curiosidade dos romeiros. A Sé Catedral de Nossa Senhora da Penha, por exemplo, ainda preserva a pia batismal onde foi realizada a cerimônia de batismo do sacerdote. O pesquisador Heitor Feitosa acredita que essas descobertas podem reduzir discordâncias entre as cidades. “Ainda hoje há essa herança do conflito entre Crato e Juazeiro. Isso gera um silenciamento da narrativa histórica, tanto do Crato como de Juazeiro. Ainda percebo que existe um ‘apartheid’ histórico entre essas duas cidades e isso precisa ser mitigado, pois tem prejudicado, de certa forma, o esclarecimento de fatos ainda mais obscuros”.
Por DN
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